Carf analisará uso de ágio interno. A lei não era clara sobre o ágio interno até a edição da MP 627.

A Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Ficais (Carf) deverá julgar em sua primeira sessão do ano, marcada para a última semana deste mês, o primeiro caso de uso de ágio interno gerado entre empresas de um mesmo grupo econômico. Voltou à pauta dos conselheiros, depois de três adiamentos, um recurso da Fazenda Nacional contra decisão favorável à Gerdau.

Em 2013, mesmo após trocas de conselheiros, o placar das disputas entre contribuintes e a Fazenda Nacional ficou empatado. Agora, caberá à mais alta instância do Carf definir se as empresas poderiam ter deduzido do Imposto de Renda (IRPJ) e da CSLL o ágio gerado por meio de reestruturações societárias internas. Para os contribuintes, essas operações só teriam sido proibidas com a edição da Medida Provisória (MP) nº 627, de 2013.

No caso, a Gerdau conseguiu, em 2012, cancelar uma autuação de cerca de R$ 700 milhões por operações que envolveram oito empresas do grupo em 2004. “O julgamento do caso Gerdau deverá conferir segurança jurídica a todas as empresas que agiram da mesma forma”, diz o advogado Flávio Eduardo Carvalho, do SSPLaw, que aposta em uma vitória dos contribuintes.

Apesar de a Lei nª 9.532, de 1997, permitir a amortização de ágio, a Receita Federal tem autuado empresas quando interpreta que a operação foi realizada apenas para a redução do IRPJ e CSLL a pagar. “Ágio interno só para gerar economia tributária, sem substância, é indevido”, afirma o procurador-chefe da Fazenda Nacional no Carf, Paulo Riscado.

A Câmara Superior já havia analisado a questão do ágio interno, dando vitória ao contribuinte. Só que apenas por meio de recurso que envolvia subscrição de ações. Em maio de 2013, a 1ª Turma, por maioria de votos, anulou uma autuação fiscal de cerca de R$ 5 milhões contra a Casa do Pão de Queijo. Os conselheiros consideraram legal a operação por equipará-la a uma aquisição normal de participação societária.

A mudança na composição das câmaras comuns do conselho, em meados de 2013, preocupou os contribuintes, especialmente aqueles que já haviam obtido decisões provisórias para afastar multas milionárias por aproveitamento de ágio interno. Mas, segundo tributaristas e a própria Fazenda Nacional, a alteração não deu vantagem para nenhum dos lados.

A Fazenda Nacional saiu vitoriosa nos julgamentos que envolvem as empresas Planova, Agrenco, Mann Hummel e BM&FBovespa. Mas especialistas chamam a atenção que, nos casos da Agrenco e da BM&FBovespa, as decisões foram proferidas depois de um “voto de qualidade”, para desempate. No caso de empate, cabe ao presidente da câmara – representante da Fazenda – definir a questão. Assim, para advogados, fica mais clara a possibilidade de reversão do resultado na Câmara Superior.

Entre os julgados favoráveis aos contribuintes estão os da Sul América Seguros, Usina Moema e Banco Gmac. No caso da Sul América, a empresa entrou com recurso contra autos de infração referentes a 2006 e 2007, nos valores de R$ 24,3 milhões (IRPJ) e R$ 14,2 milhões (CSLL). A decisão, da 2ª Turma da 3ª Câmara da 1ª Seção, foi por maioria de votos.

No julgamento, um dos conselheiros que votaram contra o uso do ágio interno no caso Agrenco, o auditor fiscal Luiz Tadeu Matosinho Machado, foi favorável à Sul América. “Se não há vício na formação do ágio, o seu aproveitamento posterior, nos termos da previsão legal, deve ser respeitado pelo Fisco”, diz no voto.

No caso da Usina Moema, a mesma turma afastou, também por maioria, um auto de infração de R$ 2,1 milhões, referente ao período de 2006 a 2008. Nesse processo, o auditor fiscal Alberto Pinto foi um dos conselheiros que votaram a favor da empresa. “Ressalte-se que a simples constatação de geração de ágio interno em reestruturação societária, sem a demonstração de que a conduta do contribuinte se configura em um ato ilícito, não justifica a qualificação da multa, a qual exige que a ação do contribuinte seja dolosa”, afirma.

No voto, o auditor também critica o próprio Carf. O conselheiro rechaçou argumento que geralmente leva à condenação de empresas: uso do ágio interno sem “propósito negocial”. “Os julgadores do Carf prestarão um grande serviço ao Estado e a sociedade brasileira se imprimirem segurança jurídica e isonomia ao sistema, evitando que suas decisões fiquem ao sabor lotérico do entendimento de cada conselheiro sobre conceitos vagos não positivados como, por exemplo, ‘falta de propósito negocial’.”

Riscado, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), admite que a subjetividade é um problema. “Isso acontece mesmo porque a lei não era clara sobre o ágio interno até a edição da MP nº 627. Assim, fazia-se a interpretação da lei”, diz.

Fonte: Valor Econômico

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