Conflito em decisões de descaminho exige pacificação

Em decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a Quinta turma considerou que ação penal por descaminho não depende de processo administrativo. O posicionamento da turma vai na contramão de sentenças proferidas pelo tribunal e pela própria turma, cenário que exigirá pacificação sobre o tema pela 3ª Seção do Superior a fim de estabelecer a segurança jurídica e a posição da Casa na matéria. Na ação, conflitante com as demais, a relatora ministra Laurita Vaz, seguida pelos demais ministros, defendeu que a “conclusão do processo administrativo não é condição para a deflagração do processo-crime pela prática de delito do artigo 334 do Código Penal, tampouco a constituição definitiva do crédito tributário é, no caso, pressuposto ou condição objetiva de punibilidade”.

O artigo 334 trata das penalidades para quem, “importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria”, traz o texto do artigo.

O descaminho é considerado um crime tributário, com isso, uma vez pagas todas as diferenças tributárias oriundas desses processos em questão, ação deveria ser extinta.

Por isso, a necessidade da condenação já ter sido discutida num processo fiscal administrativo para que então haja uma condenação na esfera penal.

Laurita reconheceu a existência de precedentes da Quinta e da Sexta Turmas corroborando a tese do recurso, mas não acolheu a argumentação.

Para ela, o fato de um dos bens jurídicos tutelados pelo crime de descaminho ser a arrecadação de tributos não leva à conclusão de que sua natureza jurídica seja a mesma do crime contra a ordem tributária.

O entendimento que se tinha antes da decisão que negou pedido de trancamento de ação penal, era de que não existia condição objetiva de punibilidade para o crime antes da conclusão do procedimento administrativo.

Segundo alguns entendimentos das Quinta e Sexta Turmas, o crime de descaminho é um crime de ordem tributária e a deflagração da persecução penal no delito pressupõe a decisão definitiva na esfera administrativa, somente após essa posição do processo fiscal que se poderá falar em ilícito tributário passível de uma ação penal.

Segundo o advogado especialista em direito tributário e responsável pela área de direito aduaneiro do escritório Emerenciano, Baggio e Associados, Felippe Breda, a decisão recente da Quinta Turma exige que tema seja pacificado, uma vez que a mesma turma tem decisões diferentes sobre o mesmo assunto.

Em um dos processos julgados, anteriores à ação relatada por Laurita, o ministro Marco Aurélio Bellizze mencionou os termos da Súmula Vinculante 24 do Supremo Tribunal Federal (STF), que estabelece como imprescindível a prévia conclusão do procedimento administrativo-fiscal para que se dê início à persecução criminal. Segundo a Súmula da Suprema Corte, “não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo primeiro, incisos um e quatro da lei 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.

De acordo com os respectivos incisos, ficam a espera de decisão administrativa os que omitem informação, ou prestam declaração falsa às autoridades fazendárias, elaboram, distribuem, fornecem, emitem ou utilizam documento que saiba, ou deva saber, falso ou inexato.

De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o raciocínio adotado pelo Supremo Tribunal Federal relativamente aos crimes previstos no artigo primeiro da Lei 8.137/90, que define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, “Consagra a necessidade de prévia constituição do crédito tributário para a instauração da ação penal, deve ser aplicado, também, para a tipificação do crime de descaminho”, defende Breda.

Embora o delito de descaminho esteja descrito na parte destinada aos crimes contra a Administração Pública no Código Penal, “a administração pública, predomina o entendimento de que com a sua tipificação busca-se tutelar, em primeiro plano, o erário, diretamente atingido pela ilusão do pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria”, diz Breda.

Ao defender sua tese, Laurita Vaz ressaltou também que no crime de descaminho os artifícios para a frustração da atividade fiscalizadora estatal são mais amplos que na sonegação fiscal, podendo se referir tanto à utilização de documentos falsificados, quanto à utilização de rotas marginais e estradas clandestinas para fugir às barreiras alfandegárias.

A relatora acrescentou que, “a exigência de lançamento tributário definitivo no crime de descaminho esvazia verificação da culpabilidade do agente, já que, segundo a legislação aduaneira e tributária, a regra nesses casos é a incidência da pena de perdimento da mercadoria, operação que tem por efeito jurídico justamente tornar insubsistente o fato gerador do tributo e, por conseguinte, impedir a apuração administrativa do valor devido”, acrescentou a relatora.

Por Fabiana Barreto Nunes.

Fonte: DCI/SP

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